terça-feira, 22 de julho de 2014

Experimento com diamante mostra como seriam as condições no interior de Saturno

Laser mais poderoso do mundo foi usado para submeter pedras preciosas à pressão de planetas gigantes


(O Globo) Nas últimas duas décadas, astrônomos descobriram mais de 1,5 mil planetas extrassolares, com outros 4,1 mil candidatos à espera de confirmação. E destes, muitos são gigantes, com tamanhos que variam do de Netuno a bem maiores que Júpiter. Neles, as densas atmosferas exercem tamanha pressão que os cientistas acreditam produzir fenômenos estranhos como chuvas de diamantes e oceanos de hidrogênio. Mas pouco se sabe de fato como a matéria se comporta nestas condições extremas, lacuna que os pesquisadores esperam começar a preencher com experimentos como o relatado na edição desta semana da revista “Nature”, no qual usaram o maior laser do mundo para submeter amostras de diamantes a uma pressão inédita equivalente a 50 milhões de vezes à da atmosfera da Terra no nível do mar.

Na experiência, os cientistas liderados por Ray Smith, do Laboratório Nacional Lawrence Livermore, EUA, focaram 176 poderosos feixes de laser em milimétricas camadas de diamante artificial colocadas sobre finas folhas de ouro, induzindo a formação de ondas de pressão que atingiram 5 terapascals, ou a mesma encontrada no centro de planetas como Saturno. O metal, assim como o método usado para elevar a pressão gradativamente, conhecido como compressão dinâmica em rampa, ajudou a dissipar o calor gerado pelo processo, evitando a liquefação das amostras de diamante durante os experimentos, que duravam apenas 20 bilionésimos de segundo.

— Não sabemos o que está escondido no núcleo de Júpiter e Saturno, mas agora pela primeira vez temos a capacidade de estudar como a matéria se comporta sob estas condições extremas de pressão e temperatura — disse Smith à rede britânica BBC. — Nossos experimentos fornecem um método para recriar as condições existentes no centro de planetas gigantes gasosos tanto em nosso Sistema Solar quanto além. Já se propôs, por exemplo, que Netuno tem um núcleo de diamante resultante da decomposição do metano compactado sob pressões extremas, e o telescópio espacial Kepler mostrou que planetas do tamanho de Netuno são muito comuns em nossa galáxia.

E o método de compressão dinâmica não vai só ajudar a entender melhor como é o núcleo de planetas gigantes gasosos. A expectativa é de que experimentos do tipo também aumentem a compreensão sobre outros astros bizarros, como grandes planetas rochosos ricos em carbono cujas condições fariam com que se tornassem enormes diamantes, a exemplo do que se acredita ter acontecido com o 55 Cancri e, uma chamada “super-Terra”, e o queocorre no núcleo de outros com composição mais parecida com a do nosso. Para isso, Smith também planeja submeter amostras de ferro ao poder do laser.

— Se quisermos entender que planetas além da Terra podem ser habitáveis, precisamos desenvolver uma compreensão mais ampla de todos os possíveis produtos finais dos processos de formação de planetas — justifica Smith.

Instalado no Laboratório Nacional de Ignição (NIF, na sigla em inglês), na Califórnia, o laser de US$ 3,5 bilhões foi construído principalmente para estudar a fusão nuclear por confinamento inercial, que pode se tornar a fonte de energia abundante e limpa do futuro. Nestas pesquisas, células de combustível, normalmente compostas de deutério e trítio, isótopos mais pesados do hidrogênio, são bombardeadas na expectativa de que as enormes temperatura e pressão deem início a uma reação em cadeia semelhante à que acontece no interior de estrelas como o Sol que libere mais energia do que a consumida para sua ignição. Daí vem o nome da instalação, que ficou famosa também por ter servido de cenário para o núcleo do motor warp da nave Enterprise no filme “Star Trek: Além da escuridão”, último lançamento da franquia, que chegou aos cinemas no ano passado.
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E mais:
Pressão no coração dos planetas (Mensageiro Sideral - Folha)
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O maior laser do mundo foi usado para recriar o núcleo de Júpiter (Hypescience)

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