terça-feira, 12 de fevereiro de 2013

“Talvez haja vida em Marte. Não sabemos”

Jim Bell, cientista norte-americano e membro da equipe Mars Exploration Rovers da Agência Espacial dos EUA (Nasa)



(Gazeta do Povo) Descobrir de onde viemos e como a vida chegou à Terra. Essas são algumas das questões que intrigam cientistas e astrônomos que estudam Marte. As missões no planeta vermelho começaram em 1976 e, atualmente, dois robôs rovers estão lá em missões de exploração – o Curiosity, desde agosto de 2012, e o Opportunity, desde março de 2004. Os cientistas já detectaram evidências de que havia água em Marte e de que o planeta era habitável.

Nesta entrevista, concedida durante o 17.º Encontro da Associação Brasileira de Planetários, em Foz do Iguaçu, o cientista norte-americano Jim Bell fala sobre o trabalho dos robôs e as suas descobertas. Confira os principais trechos.

Quais são os principais objetivos da exploração de Marte?
Bem, posso resumir que Marte é um planeta que está muito próximo da Terra e é muito parecido com ela: tem uma atmosfera rarefeita, vulcões, leitos de rios e calotas polares. Fundamentalmente, estamos estudando Marte para entender a nós mesmos. Temos grandes perguntas [“De onde viemos? Como a vida chegou aqui? Como nosso planeta se formou e mudou através dos tempos?”] e pensamos especialmente sobre a vida em nosso planeta. Não podemos voltar à história antiga da Terra porque nosso planeta é muito dinâmico e é muito difícil estudar os primórdios do nosso planeta. Marte não tem toda essa atividade. É um planeta muito menos ativo e, portanto, a história antiga do sistema solar ainda está preservada lá. Isso está orientando todo o trabalho da Nasa e dos europeus, russos, chineses, japoneses, brasileiros e outros que estão fazendo estudos sobre Marte atualmente.

Como os rovers exploram Marte?
Os rovers são, fundamentalmente, apenas máquinas. Eles não exploram. As pessoas é que exploram. Os rovers são ferramentas. Gostamos de pensar neles como se estivessem vivos, com personalidades, cérebros, mas eles não são muito espertos. São apenas máquinas. Há uma equipe de pessoas aqui na Terra que os construiu e que envia comandos a eles todos os dias: “Ande 10 metros para frente. Pare. Tire 12 fotos. Pare. Faça medidas químicas. Pare. Ande 10 metros para frente”. Esperamos que eles façam todas as coisas da lista e, no final do dia, eles enviam as informações por rádio de volta para a Terra. Nós pegamos todas as informações e processamos as imagens, olhamos os dados para decidir o que fazer no dia seguinte. É um estranho ciclo diário para se comunicar com eles. É muito longe e leva de 5 a 10 minutos para os sinais de rádio chegarem lá, em cada percurso. Às vezes, alguns dos instrumentos têm problemas ou tudo para e temos de passar um, dois ou três dias consertando. É muito mais lento do que se estivéssemos lá, mas custaria centenas de vezes mais recursos para mandar alguém lá. O maior obstáculo para mandar pessoas é o dinheiro, não a tecnologia.

Quantos rovers há hoje?
Há dois rovers que ainda estão funcionando. São quatro no total. Houve sete missões na superfície de Marte desde 1976.

Quais são os principais resultados referentes às missões mais recentes?
Provavelmente, o resultado principal é que nós supúnhamos que houve água na superfície de Marte. Os rovers encontraram a evidência efetiva na química, nos minerais e na geologia de que, sim, havia água na forma líquida lá, na superfície, há muito tempo. Estava correndo na superfície e era um meio ambiente mais quente do que é hoje. O planeta era muito diferente. Era mais parecido com a Terra e os dados dos rovers nos ajudaram a descobrir isso. É realmente empolgante.

Há evidências mostrando que Marte chegou a ser habitado?
O primeiro passo para descobrir se houve – ou se há – alguma vida lá é fazer a pergunta: “Era habitável?”. Os rovers responderam a pergunta: sim, era habitável pelo menos nesses lugares onde pousamos. Não sabemos sobre o planeta inteiro. Nesses lugares específicos existiu água, calor, talvez moléculas orgânicas. Isto é o que o Curiosity está tentando descobrir. Esses são os ingredientes que você precisa para a vida, como a conhecemos. Não vimos nada vivo em Marte. Não sabemos se há algo vivo em Marte. O meio ambiente de Marte é muito hostil na superfície. Parece com um deserto, mas você morreria instantaneamente lá por vários motivos. É muito, muito frio (79°C negativos), quase nenhuma pressão na atmosfera, não há oxigênio. Então, a vida como conhecemos, animal ou vegetal, simplesmente não pode existir lá.

Como seria a vida lá?
A maioria das buscas por vida procura por micróbios, organismos unicelulares simples ou fragmentos ou fósseis deles. Temos microscópios nos rovers e não vimos nenhum fóssil. É muito difícil encontrar um fóssil até mesmo na Terra, onde houve vida em toda parte. A probabilidade é muito baixa. Em vez de procurar por uma evidência de vida como essa, verificamos a química, os tipos de gases na atmosfera e talvez os tipos de moléculas orgânicas, pedaços que poderiam estar lá se houvesse vida. Nos concentramos no meio ambiente e nos perguntamos se o local poderia ter sido habitável. Não temos ideia do que se passa sob a superfície. Os rovers não conseguem cavar muito fundo. Então, se você descer mais abaixo da superfície, talvez fique quente, talvez ainda haja água, talvez haja vida. Não sabemos. Isso é para o futuro distante.

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